sábado, 12 de julho de 2014

O último passeio...


Olá a todas


Foi no dia 27 de Junho que a minha mãe arranjou coragem para me deixar, e ir dar o seu último passeio.

Estive ao lado dela nas horas que antecederam a sua partida e constatei que estava muito calma, serena, e assim foi... da mesma forma serena e discreta como sempre a conheci e viveu a sua vida (e a vida dela não foi mesmo nada fácil...).



A foto seguinte foi tirada em Abril do ano passado. A minha mãe adorava flores e gostava muito de ser fotografada perto delas:

- tira-me uma aqui ao pé das roseiras;
- tira-me outra aqui ao pé dos brincos de princesa:
- já me tiraste alguma ao pé da estrelícia?
- tens a certeza que "apanhaste" as flores?

E eu respondia-lhe a brincar:
- apanhei mãe, não sei é se a apanhei a si...

- não faz mal, não se perde nada, estou cada vez mais velha, já nem devia tirar fotografias.

Superou a investida dum cancro invasivo que se manifestou há 20 anos na mama, tendo "voltado ao ataque" há 10 anos, desta vez nos intestinos. Enfrentou mais essa batalha e superou o "vilão". Continuou a fazer os exames de rotina para que ele não a apanhasse de surpresa. Não descurava a sua saúde.

Sempre muito ativa, todos os dias ia às compras, quando ia ao Hipermercado perto do local onde trabalho, visita-me para me dar um beijinho e trazer-me um miminho (um chocolate, umas bolachas).

Aos fins de semana gostava muito de ir visitar jardins, em Lisboa e nos arredores.

Vivia sozinha, muito independente, com uma parca reforma, mas a compra do passe, era um extra que ela não dispensava, para poder dar as "suas voltinhas", um extra que eu sempre incentivei.

Em Julho do ano passado teve um AVC, que superou.

Em Setembro, fraturou o colo do fémur e foi operada.

Em Outubro, ainda no Hospital teve dois enfartes, com uma semana de intervalo um do outro. Teve complicações, umas hemorragias, e levou 7 unidades de sangue.

Em Novembro fez fisioterapia e recuperou o andar. Voltou para casa e mesmo com dificuldade (o coração estava fraquinho) subia e descia os 43 degraus do 2º andar onde vivia.

Em Março deste ano, queixou-se de dores muito fortes na zona lombar e foram-lhe detetadas 2 vértebras partidas, tendo passado a usar um colete lombostático e passou a estar dependente até para fazer a sua higiene.

Com uma cabeça melhor que a minha, depressa se apercebeu que a senhora que lhe dava apoio, estava cada dia mais cansada e se ela lhe faltasse, o que seria dela e de mim?

Pediu-me que procurasse um Lar, simples, mas limpinho.

Essa é "outra história" que partilharei com vocês mais tarde.

Chegou ao Lar de S. Brás de Vila Nova, onde só esteve 15 dias, muito fraquinha e a necessitar de muitos cuidados, mas foi maravilhosamente tratada, com serviços de enfermagem, alimentação adequada e muito carinho. No espaço duma semana recuperou bastante, mas uma semana depois, uma infecção urinária veio visitá-la.

Foi prontamente levada para o Hospital de Abrantes, mas no espaço de poucas horas entrou em choque séptico e disseram-me que o estado dela era muito grave, foi-lhe detectada uma sepsis (septicémia).

Ficou internada e uma semana depois, numa das visitas que lhe fiz disseram-me que duraria umas horas, mas ela, resistente, durou 8 dias.

Sempre consciente, deixou de falar, mas comunicava com o olhar. Tinha duma respiração ofegante (dispneia), mas conseguia controlar a respiração quanto eu estava a falar com o médico  ou a enfermeira. 

Deu-me tempo para falar tudo o que tinha necessidade com ela, encostava-lhe o telemóvel ao ouvido para ela ouvir as netas e a respiração ficava normal naqueles momentos... enfim, com um coração fraquinho, mas com uma enorme força de viver. Deixou os médicos e as enfermeiras confusos, sem perceber como ela aguentava. 

No dia 27 (6ª feira) pediram-me que se pudesse fosse mais cedo... o estado dela era tão fraco que eles achavam que ela estaria somente à minha espera para partir.

Cheguei pelas 12 horas, mas ela só partiu às 18h30, à hora que eu chegava às 6ªs. feiras. 

Na minha opinião ela quis dizer-me:
- escusavam de te fazer sair do emprego, porque eu ainda tinha forças para esperar por ti.

Foste uma grande guerreira, mãezinha, mas os guerreiros também descansam e imagino-te tranquila, a rever pessoas que te eram queridas, mas também a zelar por nós.

Como alguém disse:
- aqueles que amamos e partiram
já não estão onde estavam,
mas em toda a parte onde estamos

Desculpem o desabafo, o "testamento", mas apesar do dia ter aparentemente corrido bem (a minha filha mais velha fez hoje 33 anos), senti um vazio tão grande... 

Um grande beijinho a todas vocês e desculpem a minha ausência nos vossos cantinhos, mas não sei quando ficarei "mais normal".